A "messe" de CAFAL- um espaço delimitado por ramos de palmeira e situado no extremo oposto àquele onde nos encontrávamos- tinha um "telhado" de panos de tenda e folhas e um mobiliário constituído por quatro mesas e umas quantascadeiras feitas com aduelas de pipos do horrível vinho enviado de Lisboa.
Num dos cantos do quadrilátero estavam colocadas quatro arcas e um frigorífico com alimentação feita a petróleo, que devido às centenas de vezes que eram abertos durante o dia se limitavam a amornar os refrigerantes e cervejas quentes lá introduzidos.
De quando em vez ali nos deslocávamos para conviver logo após o jantar de marmita que ingeríamos mesmo junto ao "apartamento" sob um cajueiro de pequeno porte.
Se não o fazíamos com mais assiduidade, isso devia-se ao factoda distância, bem como à hipótese de sermos atacados com flagelações durante o trajecto e não podermos depois estar nos nossos lugares para dirigir a resposta.
Ainda hoje revejo com alguma nostalgia uma fotografia onde estou com o Valadas,e o algarvio Campos das transmissões a jogar cartas esperando ver o tempo passar...
Todos os dias, pessoal dos nossos dois grupos rumava para CAFINE ali a pouco mais de um quilómetro onde estava o resto da companhia entretanto chegado e a viver em tendas, experiência que faria pouco depois também com o Moura o Almeidão e também o soldado Fernandes,(maiato como eu,que era uma espécie de impedido no grupo,ele que tinha problemas de saúde e dificuldade em locomover-se devido a inchaços nas pernas)fartos que estávamos dos buracos escavados, e onde numa madrugada(corriam as cinco horas...) certamente bati o recorde mundial de salto em comprimento aquando dum ataque ao arame.
Tenho o sono pesado, e fui um bocado lento a reagir,isto é apesar de chamado pelos outros não acordei de imediato e quando me apercebi estavam os turras
a soltar impropérios e a despejar munição para cima de nós.
O espaço que mediava entre o cajueiro grande onde à sua sombra protectora havíamos instalado duas tendas contíguas e a vala circundante do abrigo era de uns bons vinte a vinte e cinco metros....
Corri, arma numa mão e cinturão na outra, formei o salto e caí na vala roçando as costas numa raíz de árvore que me cortou as ditas fazendo surgir sangue quente que fezpensar ser motivado por algum estilhço...
A dor não foi por aí além e depois do ataque quando já debaixo do chuveiro de campanha (levava apenas cinco litros de água)procurava verificar a ferida, de novo somos obrigados a um mergulho no chão.
Os turras quando abandonaram o local ainda jogaram um último RPG...
Todos os dias,dizia, o nosso pessoal se juntava ao resto da companhia em CAFINE,para então em obediência à imposição vinda de Bissau,se proceder à construção das habitações para serventia das populações, antes ainda de o fazermos para nós próprios...
Foram muitas dezenas de casas erigidas com paredes de adobe, travejamento de madeira de cibo (uma espécie de palmeira de madeira fibrosa e dura como aço) e telhado(manga de ronco...) feito de chapa de zinco canelada,as que entregamos ( sim porque ali ninguém de BISSAU se atrevia a aparecer para oficializar a entrega à guiza do que acontecera em BISSUM e
acontece aqui um pouco por todo o lado por alturas das campanhas eleitorais...
chegando mesmo a repetir-se as inaugurações sempre com a comunicação social a testemunhar o reverendo padre a abençoar...Quem tem cú tem medo!!!
Para que houvesse rapidez de execução, pois disso dependia, segundo promessa havida,a saída daquele inferno que era o Cantanhez, dei comigo, vezes sem conta, a pisar a lama e a palha que constituíam a argamassa do adobe que depois de convenientemente seco ao sol, ali mesmo junto à enorme cova de onde se extraía o barro para ganhar a consistência necessária.
Muita foi a cerveja que paguei ao pessoal por forma a incentivar a um aumento de prodituvidade pagando também a alguns Guinéus na tentativa de ter ali alguma ajuda. Raras vezes o fizeram, mesmo sabendo que os destinatérios das casas seriam eles próprios...
E não me digam que era por uma questão de hostilidade ao português e solidariedade com o PAIGC pois isso seria verdadeira imbecilidade. Trtava-se apenas de falta de hábitos de trabalho.
Todos nós sabemos que naquelas sociedades o pouco trabalho executado é tarefa das mulheres. Ao homem cabe fazer os filhos e tomar umas bebedeiras....
Não foi nada fácil esta tarefa de feitura de habitações, tanto mais que era problemático definir uma localização porquanto os velhoshaviam já escolhido o mangueiro sob o qual pretendiam ser enterrados, não abdicando das suas ideias o que implicava uma perda de tempo que poderia ser precioso.
A juntar a este obstáculo da luta contra o tempo, havia a guerra em que estávamos envolvidos e agora também a sabotagem feita pelo PAIGC, que não via com bons olhos a ideia de reordenamento pois representava a possibilidade de trazer as populações para o nosso lado da barricada.
Como corolário dessa sabotagem aconteceu o episódio da mina colocada na estrada de ligação entre CAFAL e CAFINE, todos os dias coberta por vários camiões transportando o nosso pessoal em número considerável e que acabaria por ser espoletada à passagem de um UNIMOG 404 da companhia de CAFAL onde circulava apenas o motorista e o cabo da arrecadação, tendo o primeiro morrido e o segundo sofrido ferimentos de gravidade que implicaram de imediato a sua evacuação para LISBOA.
Relembro outra situação em que avançamos por zona IN por entre um tabancal onde não se via ninguém, mas onde curiosamente as casas ostentavam palha nova no telhado, isto quinze dias após a visita da tropa especial, numa operação algo complicada, que redundaria na queima das coberturas das palhotas.
domingo, 25 de janeiro de 2009
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário